sexta-feira, 20 de julho de 2012

Artigos aprofundam relação entre saúde e meio ambiente




Apesar de ter como foco central a economia verde no contexto do desenvolvimento sustentável, além da erradicação da pobreza, a Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável (Rio+20), realizada em junho de 2012, explorou pouco um campo que cresce cada vez mais: a relação entre saúde e ambiente. O tema, que mobiliza representantes da saúde pública e coletiva, foi amplamente abordado nos textos científicos reunidos no volume 17, número 6, da revista Ciência & Saúde Coletiva, da Abrasco, que tem como editora a pesquisadora da ENSP Maria Cecília Minayo. Pesquisadores da Escola que participaram da Rio+20 em conferências, atividades culturais, campanhas e stands, expondo as pesquisas da instituição nas áreas de saúde pública e meio ambiente, representam mais da metade dos artigos (16 dos 27) publicados nessa edição, trazendo contribuições de diversos saberes disciplinares e interdisciplinares aos debates propostos para a conferência.

A participação da Escola começa no editorial 'Rio+20: (In)sustentabilidade e saúde coletiva', parceria do pesquisador da ENSP Ary Miranda com o pesquisador da USP Nelson Gouveia. No texto, Gouveia e Miranda comentam que o mundo está diante de dois caminhos, com lógicas e interesses distintos e contraditórios, para o enfrentamento da crise socioambiental: o da economia verde, de um lado, pauta dos fóruns oficiais, que lapida a mercantilização da natureza através da constituição de novos mercados, como o do carbono, buscando no capitalismo a solução para a crise imposta pelo próprio capital; e, de outro, a pauta da Cúpula dos Povos está ancorada na construção de uma sociedade baseada na economia solidária e na agroecologia, que busca preservar a natureza como um bem comum.

Analisar os impactos sociais e para a saúde resultantes da construção dos complexos de usinas hidrelétricas de Tucuruí (Pará, Brasil) e de James Bay (Quebec, Canadá) foi o objetivo do estudo de Adriana Renata Sathler de Queiroz e Marcelo Motta-Veiga, ambos da ENSP, que resultou no artigo 'Análise dos impactos sociais e à saúde de grandes empreendimentos hidrelétricos: lições para uma gestão energética sustentável'. No estudo, os autores observaram um desencadeamento sucessivo de impactos sociais nas categorias de trabalho e renda, educação, saneamento, ambiente físico e cultura, associados a agravos à saúde como estresse, distúrbios nutricionais, distúrbios psicossociais, cardiopatias, doenças respiratórias e digestivas. "As ações mitigadoras e compensatórias foram tardiamente implementadas e visavam remediar os efeitos dos impactos negativos. Contudo, mesmo decorridas três décadas, essas ações se mostraram ineficientes para a resolução de todos os problemas socioambientais e também àqueles ocasionados à saúde", afirmam.

O texto 'Saúde ambiental e desigualdades: construindo indicadores para o desenvolvimento sustentável', de Carlos Machado de Freitas (ENSP), Fernando Ferreira Carneiro (UNB), Guilherme Franco Netto (Ministério da Saúde), Carlos Corvalan (Opas/OMS) e Luiz Belino Ferreira Sales (Ministério da Saúde), mostra que o Brasil, mesmo com avanços nos indicadores socioeconômicos, ainda apresenta altos índices de desigualdade, resultantes de um desenvolvimento historicamente excludente. Os autores escolheram o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) e indicadores sociais, econômicos, ambientais e de saúde para exemplificar essa problemática. No âmbito nacional, verificou-se, entre o início dos anos 2000 e o fim dessa década, uma importante melhora do indicador do pilar econômico, com uma grande diminuição de pessoas vivendo com menos de 1/4 de salário mínimo. Além disso, os indicadores referentes aos pilares social e ambiental apresentaram melhorias, embora em menor grau. "Concluiu-se que para alcançar um desenvolvimento sustentável com qualidade de vida, a melhora dos indicadores de saneamento e de educação deve ser uma prioridade para o Brasil", ressaltam.

Já Edmundo Gallo (ENSP) e Andréia Faraoni Freitas Setti (Centro de Relações Internacionais em Saúde/Fiocruz) apresentam, em 'Abordagens ecossistêmica e comunicativa na implantação de agendas territorializadas de desenvolvimento sustentável e promoção da saúde', uma análise da adequação de tais abordagens para a implantação de agendas territorializadas integradoras dos princípios do desenvolvimento sustentável e da promoção da saúde. Os autores utilizaram como referência o projeto Desenvolvimento Sustentável e Promoção da Saúde: Implantação da Agenda Cidades Saudáveis Integrada à Agenda 21 nas Comunidades Tradicionais de Áreas Protegidas do Mosaico da Bocaina, trabalho que objetiva contribuir para a promoção da qualidade de vida por meio da implantação coletiva de agenda estratégica local e promoção da sustentabilidade econômica solidária.

'Gestão ambiental e democracia: análise crítica, cenários e desafios' é o título do artigo de Marcelo Firpo (ENSP), em parceria com Gabriel Eduardo Schütz (UFRJ), em que discute os limites, as alternativas e os desafios da gestão ambiental nas sociedades contemporâneas inseridas no capitalismo globalizado a partir de uma análise crítica apoiada em autores das ciências sociais, da ecologia política e da saúde coletiva. Os autores constroem quatro tipos ideais de cenários envolvendo possíveis combinações entre gestão ambiental e democracia para trabalhar suas ideias. Segundo eles, tal modelo serviu de base, junto com trabalhos acadêmicos e a experiência teórica e militante dos autores, para uma reflexão sobre as características atuais e as tendências futuras de gestão ambiental e democrática, com ênfase na realidade latino-americana, mais especificamente na brasileira.

Edmundo Gallo (ENSP), Andréia Faraoni Freitas Setti, Danielly de Paiva Magalhães e Paulo Marchiori Buss (Centro de Relações Internacionais em Saúde/Fiocruz), Jorge Mesquita Huet Machado (Fiocruz Brasília) e Daniel Forsin Buss (IOC/Fiocruz) apresentam, em 'Saúde e economia verde: desafios para o desenvolvimento sustentável e erradicação da pobreza', um cenário onde os serviços ecossistêmicos vão sendo perdidos, com graves iniquidades sociais, sendo necessário um novo modelo de crescimento capaz de promover o desenvolvimento social com a redução da pegada ecológica. A 'economia verde' surge como um dos modelos propostos. No artigo, os autores analisam os impactos ambientais, sociais e individuais da economia marrom na saúde humana e aborda as contribuições da economia verde para a promoção da equidade e saúde.

Discutir a atual configuração da governança da e para a saúde e ambiente no contexto do desenvolvimento sustentável é o objetivo do artigo 'Governança em saúde e ambiente para o desenvolvimento sustentável', de Paulo Marchiori Buss, Danielly de Paiva Magalhães e Andréia Faraoni Freitas Setti (Centro de Relações Internacionais em Saúde/Fiocruz), Jorge Mesquita Huet Machado (Fiocruz Brasília), Edmundo Gallo (ENSP), Francisco de Abreu Franco Netto (VPAAPS/Fiocruz) e Daniel Forsin Buss (IOC/Fiocruz). Segundo os autores, os Objetivos do Milênio foram um significativo esforço político que, apesar dos progressos, falhou ao omitir as causas estruturais dos modos de produção e consumo e da distribuição desigual de poder que são as produtoras das iniquidades e impedem o verdadeiro desenvolvimento. Para eles, "é fundamental o prosseguimento da implantação dos princípios da Agenda 21, o cumprimento dos ODM e a criação dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável".

Marcelo Firpo Porto e Renan Finamore (ENSP) discutem em 'Riscos, saúde e justiça ambiental: o protagonismo das populações atingidas na produção de conhecimento', a participação das comunidades em situações de injustiça ambiental na produção de conhecimentos, decorrentes de desigualdades e de discriminações na distribuição de riscos e benefícios do desenvolvimento econômico. A partir de uma visão ampliada de saúde, os autores debatem os limites das abordagens científicas em reconhecer a importância do saber local, seja para analisar riscos ambientais ou seus efeitos para a saúde, incluindo os estudos epidemiológicos. O artigo apresenta ainda contribuições e avanços decorrentes de movimentos por justiça ambiental.

'As queimadas na região amazônica e o adoecimento respiratório' é o tema do artigo de Karen dos Santos Gonçalves, Hermano Albuquerque de Castro e Sandra de Souza Hacon (ENSP) nessa edição, em que lembram que a consciência global sobre seus possíveis impactos é relativamente recente. Os autores explicam que a ocorrência de grandes queimadas no cenário brasileiro e internacional despertou a atenção para o problema, mas que as medidas tomadas para prevenir e/ou controlar o problema ainda são insuficientes. A  revisão realizada por eles apresenta trabalhos desenvolvidos nos últimos cinco anos sobre as queimadas na Amazônia Brasileira e o adoecimento respiratório, objetivando fornecer elementos para gestores e dirigentes ambientais sobre as questões que norteiam os problemas relacionados à queima de biomassa florestal na região amazônica.

Mariana de Araújo-Pinto, Frederico Peres e Josino Costa Moreira (ENSP) destacam em 'Utilização do modelo FPEEEA (OMS) para a análise dos riscos relacionados ao uso de agrotóxicos em atividades agrícolas do estado do Rio de Janeiro' os dois principais ramos representativos do estado: a agricultura familiar na Região Serrana e a monocultura da cana-de-açúcar na região Norte Fluminense. Entre os resultados apresentados, grande parte dos determinantes identificados na Matriz FPEEEA estão relacionados às deficiências nas ações de fiscalização e vigilância do uso de agrotóxicos e de assistência técnica por parte do Poder Público do estado do Rio de Janeiro. Segundo relatado, a maioria das ações desenvolvidas está concentrada no enfrentamento dos efeitos e, em menor escala, da exposição, deixando de focar os níveis mais superiores da matriz como as forças motrizes e de pressão.

Em 'Contaminação de águas superficiais e de chuva por agrotóxicos em uma região do estado do Mato Grosso', Josino Costa Moreira, Frederico Peres e Ana Cristina Simões (ENSP), em parceria com Wanderlei Antonio Pignati, Eliane de Carvalho Dores, Sandro Nunes Vieira e Christine Strüssmann (UFMT) e Tamí Mott (UFAL), analisam a contaminação de águas superficiais e de chuvas por agrotóxicos nos municípios de Lucas do Rio Verde e Campo Verde, que estão situados entre os maiores produtores de soja, milho e algodão do estado do Mato Grosso e do país. Resultados das análises realizadas mostraram a presença de resíduos de diferentes agrotóxicos nas amostras de águas superficiais e de chuva coletadas em ambos os municípios. Associados a esses dados, resultados das análises ecotoxicológicas mostraram a presença de anomalias em uma espécie de anfíbio anuro coletado em uma das duas localidades, compatíveis com exposição a agrotóxicos.

Discutir a evolução da leptospirose no município do Rio de Janeiro, pelas suas trinta e duas regiões administrativas, no período de 1996 a 2009, testando a hipótese de que as variações climáticas acarretam um aumento no número de casos da doença é o foco do artigo 'Variáveis climáticas, condições de vida e saúde da população: a leptospirose no município do Rio de Janeiro de 1996 a 2009', de Teresa Vieira dos Santos de Oliveira, Diana Pinheiro Marinho, Cristina Costa Neto e Débora Cynamon Kligerman (ENSP). Os autores concluíram que há correlação entre a incidência da leptospirose e a pluviometria, enfatizando que a oscilação do número de casos não é determinada apenas pelo índice pluviométrico, uma vez que outros fatores influenciam nessa dinâmica, tais como saneamento e fatores ambientais e sociais.

O trabalho 'Vulnerabilidade socioambiental, redução de riscos de desastres e construção da resiliência – lições do terremoto no Haiti e das chuvas fortes na Região Serrana, Brasil', de Carlos Machado de Freitas (ENSP), Mauren Lopes de Carvalho, Elisa Francioli Ximenes e Eduardo Fonseca Arraes (Cepedes/Fiocruz) e José Orlando Gomes (UFRJ), analisa, através de uma contribuição de natureza conceitual e dos exemplos de desastres em países com níveis de desenvolvimento diferentes (terremoto do Haiti e as chuvas fortes na Região Serrana do Rio de Janeiro), como a vulnerabilidade socioambiental cria condições para os desastres, ao mesmo tempo em que limita as estratégias para prevenção e mitigação. No texto, os autores apontam alguns dos desafios que a redução de riscos de desastres e a construção da resiliência exigem em contextos de vulnerabilidade socioambiental.

Propor uma revisão da literatura científica publicada entre 1979 e 2010 sobre condições de trabalho no cultivo do tabaco, com ênfase particular no contexto brasileiro, é o objetivo do artigo de 'Saúde, ambiente e condições de trabalho no cultivo de tabaco: revisão de literatura', de Deise Lisboa Riquinho e Elida Azevedo Hennington (ENSP). Através da análise de 37 trabalhos selecionados em inglês, espanhol e português, os autores destacam a 'doença da folha do tabaco verde’, os distúrbios respiratórios, as lesões músculo-esqueléticas e as doenças mentais como grandes problemas para os trabalhadores da área.

Em 'Enchentes e saúde pública - uma questão na literatura científica recente das causas, consequências e respostas para prevenção e mitigação', Carlos Machado de Freitas (ENSP) e Elisa Francioli Ximenes (Cepeds/Fiocruz) pretendem oferecer subsídios para uma melhor compreensão desses eventos através dos resultados e experiências encontrados na literatura científica recente. Os autores analisaram 70 trabalhos aos quais tiveram acesso e que se enquadraram nos critérios de abordar pelo menos um dos itens selecionados para análise, que eram: causas; consequências; respostas e ações; encaminhamento de propostas; soluções para a prevenção e/ou mitigação dos riscos; e impactos das enchentes. "Considerou-se que, dados os cenários de aumento na frequência e gravidade desses eventos, os desafios para o setor saúde para a redução de riscos de desastres exigem respostas integradas com amplas políticas para o desenvolvimento sustentável", destacam.

O trabalho 'A importância da abordagem contextual no ensino de biossegurança', de Maria Eveline de Castro Pereira (CIB/Fiocruz), Pedro César Teixeira Silva (ENSP), Marco Antonio Ferreira da Costa (EPSJV/Fiocruz), Claudia Jurberg (UFRJ) e Cintia de Moraes Borba (IOC/Fiocruz) ressalta o papel da biossegurança como um campo do conhecimento que insere questões voltadas para organismos geneticamente modificados e relacionadas à proteção social e ocupacional do trabalhador. Segundo os autores, "seu processo educativo visa à formação de um agente participativo-transformador e, portanto, deve ultrapassar a simples ideia da normalização, sendo importante contextualizar a biossegurança dentro de uma estratégia de ensino construtivista com a identificação dos seus conceitos estruturantes – risco, perigo e acidente – que permitam ao indivíduo compreender como o risco é percebido na sociedade e enfocado na academia, para, em seguida, agregar múltiplas competências e enfrentá-lo".

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