Noção estruturante do modo de vida contemporâneo requer olhar crítico, sobretudo na Saúde
Para os dicionários, a palavra risco traduz-se como possibilidade de perigo capaz de ameaçar alguém ou alguma coisa. Em várias áreas da ciência, como a Economia, a Engenharia e a Epidemiologia, risco é um conceito complexo, com múltiplos desdobramentos. Na Saúde, ele veio se tornando, desde a primeira metade do século 20, uma ferramenta valiosa em pesquisas, práticas e políticas públicas. Muitos conhecimentos produzidos a partir de análises e cálculos de risco epidemiológico contribuem para prevenir doenças e proteger vidas. No entanto, estudiosos do tema apontam que, apesar de toda a sua formalização matemática, que lhe dá ares de objetividade, o conceito de risco é uma construção social do nosso tempo. E que seu uso acrítico e excessivo pode originar distorções, equívocos e, em última análise, sofrimento. Exemplo emblemático disso foi a classificação, e consequente estigmatização, de pessoas nos chamados “grupos de risco” para HIV/aids há pouco mais de duas décadas.
Reflexões críticas sobre o risco em âmbito mais geral começaram a tomar forma na década de 1980 e se intensificaram nos anos 90 em várias áreas do conhecimento, destacadamente nas Ciências Sociais e na própria Epidemiologia. Na Saúde, a discussão está longe de se esgotar, e ganhou novo reforço com o lançamento do livro Correndo o risco: uma introdução aos riscos em saúde (Editora Fiocruz, 2010), de Luis David Castiel, Maria Cristina Rodrigues Guilam e Marcos Santos Ferreira. Organizado em forma de perguntas e respostas, o livro discute, entre outras coisas, o papel do risco no discurso da promoção da saúde e sua relação com a noção de estilo de vida. Mas talvez o principal questionamento subjacente à obra possa ser colocado da seguinte forma: será que estamos vivendo bem com todo o conhecimento produzido a partir desse conceito?
“Com tanta ciência, tanta ansiedade”, comenta Luis Castiel, dando o tom de sua entrevista à Radis. Pesquisador titular do Departamento de Epidemiologia e Métodos Quantitativos em Saúde e professor dos programas de pós-graduação em Saúde Pública e de Epidemiologia em Saúde Pública da Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca (Ensp/Fiocruz), Castiel tem trabalhos que abordam o risco publicados desde a década de 1990. Para ele, o conceito de risco carrega excessos e pretensões nada modestas associadas à ciência, principalmente, a de tornar possível prever e controlar todas ou quase todas as situações que ameaçam nossas vidas e nossa saúde.
Claudia Lopes
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